
Mais uma vez encafuei as minhas tralhas dentro da mala,
cuidei de verificar que não deixava nada para trás e arrumei tudo o melhor que
pude numa das viaturas que, no largo frente ao comando, aguardavam o momento de
nos levarem para a cidade. Acomodei-me num canto qualquer, disse adeus a quem
ficava e aguardei sem pressa a hora da partida.
As viaturas subiram a rua, lentamente. Passaram frente à
messe, depois pelo boteco do Manolo, o barracão do cinema e finalmente a
cancela de controlo já guardada por soldados acabados de tomar o nosso lugar. A
guerra seguia em frente, naquela sistemática substituição de contingentes, uns
a chegar outros a partir numa permanente adaptação a novos lugares e novas
missões. Para os recém-chegados, a acalmia necessária para lamber as feridas da
alma, para nós, o adeus definitivo aos quartos de sentinela, às rondas
nocturnas e à limpeza das armas, arrumadas a um canto desde que libertos da
savana.

Penetrámos o trânsito citadino. Nada a que já não
estivéssemos habituados. Os últimos tempos nas Mabubas, com as frequentes idas
e vindas a Luanda, fizeram-nos esquecer o silêncio da enorme e desértica
savana. Mas esta última viagem materializava o regresso definitivo à
civilização, ao bulício da cidade, ao trânsito, com tudo o que isso tem de bom
e de mau. Para mim, contudo, representava finalmente a fuga às agruras e aos
tratos de polé infligidos por uma natureza hostil. Agora sim, a mata ficava
para trás e a guerra, que sentimos ir desaparecendo das nossas vidas no sossego
das Mabubas, chegara definitivamente ao fim.
Entrámos no Grafanil, uma espécie de antecâmara para o inferno das matas e o stress da guerra para quem chegava a Angola. Passáramos por isso dois anos e quase dois meses atrás. Mas, para nós, que chegávamos ao fim daquela malquista missão, representava o limiar da civilização e o recomeço da vida que ficara parada no tempo.
Entrámos no Grafanil, uma espécie de antecâmara para o inferno das matas e o stress da guerra para quem chegava a Angola. Passáramos por isso dois anos e quase dois meses atrás. Mas, para nós, que chegávamos ao fim daquela malquista missão, representava o limiar da civilização e o recomeço da vida que ficara parada no tempo.