segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Os Velhos...ou a sabedoria!

Sempre me fascinou a serenidade dos rostos dos velhos da N'Riquinha.
Austeros nos sorrisos mas sempre amigáveis, nunca subservientes mas atentos e respeitadores, irradiavam simpatia e bondade no contacto com a tropa. A sua dependência diária em relação a nós raramente era visível, se bem que necessária por força das circunstâncias. Sabiam - com a sabedoria que 500 anos de colonialismo lhes tinha ensinado - distinguir e separar das suas vidas pessoais e comunitárias a obrigação e a necessidade de connosco conviver.
Dotados de conhecimentos extraordinários, empiricamente acumulados durante milénios, no campo da sobrevivência, da medicina natural e da natureza, obrigavam-nos e impunham-nos um respeito natural que, felizmente, a Companhia sempre soube observar.
Contudo, o que me fascinava, era os seus olhos, vivos, brilhantes e matreiros que luziam no meio dos rostos cobertos de rugas que os anos e a inclemência da natureza lhes gravaram na pele.






3 comentários:

Gabriel Costa disse...

Caro José Maria:
Grato pelo contato. Concerteza que seguirei o seu blog.
Um abraço
Gabriel

Anónimo disse...

Bons retratos dos velhos da Neriquinha! Lembro-me de quase todos eles. Sentados em frente da sua palhota, diante de um pequeno fogo, conversando sabia-se lá de quê, engendrando concelhos, quais sabios daquele kimbo ali encostado à tropa. Também eles esperando pelo passar do tempo. Uns até com alguma atividade, nomeadamente na confecção de artesanato, que posteriormente nos vendiam - machados, cachimbos, tambores, kisanges, máscaras... São as únicas recordações materiais, que trouxe daquelas terras do fim do mundo e que ainda possuo como objectos de decoração. Souvenirs que quando os vejo ou mostro a amigos ou familiares, me transportam àqueles 18 meses (de isolamento da civilização) ali vividos.
Por curiosidade, respeitante ao primeiro retrato, e áquela personagem, ao fixa-lo dá-nos a sensação de uma certa agresividade, pois a forma como empunha a sua faca e aquele olhar fixante, assim o dá a entender, ou talvez não. A fotografia é o congelar de um exato momento, que não se volta a repetir e é só o seu autor que sabe o que ali se passou, só ele poderá complementar com mais pormenores. Contudo, a celebre fraze "uma fotografia vale mais que mil palavras" tudo ficará dito. O resto, fica à imaginação de cada um. Congratulo o autor da xikupula.
Tenho uma foto daquele homem, mas apenas o fixei de soslaio, Gesticulando e proferindo palavras que eu não entendia, apenas o ...não xikupula não xikupula! E lá fugiu a sete pés. O que não era muito vulgar, uma vez que a maioria até fazia posse para ficar no boneco. Coisas de velhos, outras mentalidades, outras culturas. Quem sabe, no seu entender, a fotografia de si mesmo, lhes roubava a alma?
Estes personagens (os velhos) e os do anterior post do Cardoso (os putos) ambos passaram pelas nossas vidas e com eles vivemos e convivemos - exatamente os mesmos. No meu tempo ainda mais "velhos"...
Continuo a acompanhar o v/blg. Recordando...
Um grande abraço
Fernando Simões - ex Furriel Mil. da 1ª C.Caç.5012

Egidio Cardoso disse...

É verdade, "não xikupula" ouvia-se com frequência, num tom assustado, sempre que se lhes apontava uma máquina fotográfica. Os ganguelas entendiam que lhes roubava a alma.
Para se fazer uma boa fotografia, era preciso ganhar a sua confiança, tirá-la à sucapa ou então de longe, com tele-objectivas, de forma a que não dessem por isso.
Mesmo assim desconfiavam. Tenho algumas, tiradas ao longe, onde é bem visível uma pose defensiva, ao se aperceberem de que lhes estavamos a apontar uma câmara.
Traduzido para português, "não xikupula" significava "fotografia não".